Por Marco Antonio Coutinho Jorge
Texto originalmente publicado em evento organizado por Antonio Quinet e Maria Anita Carneiro Ribeiro.
Quando a jovem de 19 anos Madonna Louise Veronica Ciccone saiu de Michigan, em julho de 1978, com um punhado de dólares no bolso, e foi para Nova Iorque, ela só tinha um único pensamento em mente: que sua vida seria muito diferente da das outras pessoas e se divertiria sempre.
Seu nome, o mesmo de sua mãe, morta quando ela tinha apenas 5 anos, contou muito em sua história. Depois de ter conhecido Madonna pessoalmente, Andy Warhol escreveu em seus Diários que, quando um artista chegava a Nova Iorque, ele tinha que arranjar um nome (aliás, este foi o caso dele mesmo, que mudou seu sobrenome Warhola para Warhol), mas que Madonna já tinha chegado com o nome pronto e, mais do que isso, verdadeiro! Ela mesma disse uma vez, insinuando com humor a clássica dicotomia apontada por Freud sobre o feminino – a santa e a prostituta –, que com este nome, ela não tinha escolha: ou seria uma freira ou seria quem ela é.
É impressionante a biografia dessa mulher que desde a infância foi movida por um poderoso desejo de estrelato, um desejo decidido que fez com que ela fosse odiada por muitos, inclusive pelo irmão Christopher, que trabalhou com ela algum tempo. Mas é igualmente surpreendente ver como um sujeito que exerce plenamente seu desejo incomoda o outro, que frequentemente se queixa dele como “perverso”, culpabilizando-o e se vitimizando por ter lhe dado tudo e não ter sido reconhecido. A biografia de Madonna é cheia desses episódios, narrados pelos protagonistas desse lugar da queixa, mas questionados por ela com uma tranquilidade inabalável.
O desejo decidido do sujeito que parte para a ação angustia o outro e o aproxima do que está abaixo das “camadas de negação” (expressão iluminada de um analisando) com as quais ele se reveste frequentemente. Vemos que o mesmo parece ter ocorrido com Jacques Lacan, ao levarmos em consideração os fatos relatados em sua biografia: um homem de desejo decidido, que frequentemente parecia não aceitar um não e por isso mesmo às vezes horrorizava as pessoas à sua volta. A pergunta que se coloca quanto a ambos e que pode ser estendida aos artistas em geral e, quem sabe, aos psicanalistas, é sobre a especificidade do desejo que é passível de ser encontrado no artista e no psicanalista.
Apenas um único exemplo – e bem precoce – ilustra a maneira pela qual esse desejo se manifesta em Madonna. Ao estar, afinal, prestes a assinar seu primeiro contrato de gravação, depois de vários anos tentando consegui-lo com diferentes empresários, Madonna não hesitou em ir até o hospital onde estava internado o diretor da gravadora, recém-operado do coração, para lhe pedir a assinatura que faltava para o contrato estar finalizado. Ele assinou rapidamente, assustado por aquela presença agressiva e carismática, e em seguida Madonna lhe disse: “Sou sua. Agora me dê o dinheiro!” E desde que a jovem Madonna, ao receber um prêmio na MTV vestida de noiva pela sua música Like a virgin, se jogou no chão em 14 de setembro de 1984, simulando um ato sexual, não se parou mais de falar dela.
II
Todos os textos da mídia sobre Madonna reverenciam a mesma imagem megalomaníaca que hipnotiza: a maior artista do planeta, que já vendeu não se sabe quantos milhões de discos, a rainha do pop (que sede de reis e rainhas existe por aí: todos que são profundamente admirados acabam virando figuras da monarquia), poderosa, bilionária, devoradora de homens e mulheres, pérfida (o retrato feito por seu irmão). Mas talvez não se saiba o suficiente que Madonna é amplamente estudada no âmbito acadêmico norte-americano, onde há setores dedicados aos chamados Madonna studies. O New York Times lhe dedicou, em dezembro de 1990, um editorial assinado por Camille Paglia e intitulado: “Afinal, uma verdadeira feminista”. Um segundo editorial de Paglia reforçou a ideia de que Madonna é muito mais do que a cultura pop pede de seus ídolos, apenas que eles sejam talentosos e inovadores.
Ao falar dela como representando a complexa plêiade do feminismo, Paglia foi uma das primeiras teóricas a perceber a força de Madonna, que não se restringe ao estrelato pop, mas vai fundo na criação em diversas direções. Cercando-se dos melhores dançarinos, DJs, arranjadores, produtores, vestindo figurinos estonteantes de figurinistas vanguardistas, ela elevou o espetáculo pop à categoria de performance artística musical.
Mas pouco se tem falado de M. (ela já se designou por meio dessa letra maiúscula) de modo sério, como uma criadora ímpar e levando em conta a sua criação e não a sua personagem. Algo semelhante ocorreu com o pintor catalão Salvador Dalí – o único surrealista que Freud confessou admirar – cujas excentricidades muitas vezes desviaram a atenção de sua arte. M. é muito séria e precisa ser compreendida seriamente. Mas é claro que, como já disse Lacan, o sério não é o sisudo, o que se veste de cinza e se comporta adequadamente; o sério, no sentido etimológico do termo, é aquele que faz série, é aquele que avança numa certa direção – não importa qual – que revele a insistência contínua do desejo inconsciente.
E falar de insistir no desejo é falar de Madonna. Desde o início movida por uma fortíssima obstinação em conseguir o estrelato, ela adotou em sua vida uma disciplina física espartana para poder levar adiante os projetos mais arrojados. Foi taxada de exibicionista por críticos superficiais, que se esqueceram de se perguntar se há algum artista que não seja exibicionista. O campo da arte é o da exibição: de pintura, teatro, cinema, dança. Toda arte, ao expor, exibe. E afinal não são os artistas que sempre dão shows? A palavra show significa mostrar, exibir. Valendo-se das conquistas tecnológicas mais avançadas e inusitadas, Madonna salientou em seu trabalho essa característica.
E falar de insistir no desejo é falar de Madonna.
É necessário falar da criadora Madonna com cuidado, sintonizando-nos com a agudeza de suas formulações e propostas, levando em conta a sua criação e não a sua personagem. Ou talvez levando as duas coisas em consideração como uma única coisa. Pois Madonna é performática na vida e no palco. Ela mesma observou certa vez: “Houve tanta controvérsia sobre minha carreira na década passada que praticamente não deram atenção à minha música.” Exemplo disso foi a pouca receptividade dada a um de seus melhores discos, Erotica, devido ao escândalo provocado pela recente publicação do livro Sex, que lhe mostrava não somente nua comendo uma fatia de pizza junto ao balcão de uma pizzaria ou pedindo cartona na estrada, como também em posições orgiásticas com figuras famosas e exercendo sua bissexualidade sem medo ou culpa. A palavra de Madonna é sempre elevada como porta-voz da liberação do feminino – tanto nas mulheres como nos homens.
III
Vejo em Madonna mais a presença do feminino, tal como concebido por Jacques Lacan, do que do feminismo. Quando Lacan formula que A/ mulher não existe, significando, entre outras coisas, que não existe uma representação total da mulher que a defina de uma vez por todas, pode-se deduzir daí uma série de reflexões sobre as mulheres. A mulher sempre foi pensada como uma verdadeira invenção. Talvez por isso mesmo, a cada mulher é requerido que se reinvente continuamente. A moda feminina, por exemplo, é um excelente índice de sua elevada necessidade de se reinventar.
Como Scherazade – descrita nas 1001 noites como a mulher mais fascinante do sultanato, não apenas por sua extasiante beleza, mas também por sua inteligência, seu saber sobre diversas artes e ciências, assim como pelo poder de sua linguagem –, que se reinventa a cada noite, através da narrativa de fábulas maravilhosas, para conter a fúria assassina e vingativa do sultão, Madonna se reinventou desde sempre, chegando a fazer uma tournée chamada Reinvention Tour. Ela disse na época: dizem tanto que eu me reinvento o tempo todo, então minha tournée se chamará assim. Tal como Scherazade, ela não é uma, mas mil e uma, e, como que ilustrando o aforismo lacaniano que postula que “A mulher não existe”, Madonna Scherazade reinventa o feminino o tempo todo. Essa pluralização de sua própria imagem expressa sua maneira de recriar continuamente a imagem feminina: se A mulher não existe, então ela pode – e deve – ser reinventada.
A maternidade é, para Madonna, uma das formas de se reinventar, e com a maternidade e o nascimento de sua primeira filha, Lourdes Maria, ela produz um de seus CDs mais densos e ricos musicalmente. Ray of light, raio de luz, canta a vinda da filha como uma dádiva divina – ela que já havia falado da vida como um mistério na canção Like a prayer.
IV
Sua primeira canção gravada é emblemática de sua produção posterior, ela chamava-se Everybody, Todo mundo, mas também literalmente “todo corpo”. O corpo é onipresente em Madonna. Na emblemática Vogue ela canta: “Make your body move with the music, make your body go with the flow”, “Faça seu corpo se mover com a música, faça seu corpo ir com o fluxo”. Tendo começado como uma dançarina no período em que ainda estava em Michigan, Madonna sempre considerou a dança uma de suas maiores potencialidades. E se considerarmos todo o seu investimento na atividade corporal, no body building, pode-se ampliar seu conceito de dança à expressão corporal enquanto tal, que se alia à poesia para constituir uma verdadeira performance artística.
Mas o corpo em Madonna é o corpo erótico e, por que não dizer, corpo freudiano. Observe-se a imagem da capa do cd Erotica. Nada mais apropriado para ilustrar o conceito psicanalítico de pulsão sexual: não existe o contorno de um rosto definido, mas apenas os orifícios da face – olhos, ouvidos, narinas e boca. Os olhos fechados insinuam o gozo. A boca aberta alude ao gemido e ao canto. O erótico é orificial, o resto não importa e a unidade da imagem do rosto é desprezada. A pulsão despedaça o eu corporal em regiões bastante específicas, as zonas de borda, as quais por sua estrutura se prestam especificamente ao prazer e à troca com o outro.
Capa de Erotica (1992).
As letras que aparecem com os nomes Erotica e Madonna são tortuosas, verdadeiros garranchos, como se tivessem sido escritas ali contra a vontade de quem escreveu, ou talvez porque fosse necessário ter estes nomes impressos na capa. Além disso, a “linha” de sua escrita é o contorno do rosto, que não existe. Em suma, nessa montagem o gozo é figurado ao mostrar sua absoluta incompatibilidade com a palavra. Como ressaltou Lacan para exemplificá-lo, no ato sexual o sujeito pode dizer: “Eu gozei”, ou “Eu vou gozar”, mas jamais pode dizer, no presente, “Eu gozo”. O gozo é antinômico à palavra e entrar na linguagem é perder gozo.
Na contracapa do cd, uma foto em negativo dificulta a visualização da imagem, mas aos poucos não há dúvidas: Madonna chupa o dedão do pé! Nenhuma outra imagem poderia ilustrar melhor a pulsão sexual do que a de uma mulher que chupa um dedão do pé. A pulsão não possui um objeto definido, este pode ser qualquer um, mesmo o mais imprevisível e insuspeitado, e a descrição que Lacan faz da montagem pulsional pode ser aplicada a essa imagem com precisão: “A montagem da pulsão é uma montagem que, de saída, se apresenta como não tendo nem pé nem cabeça – no sentido em que se fala de montagem numa colagem surrealista. [...] A imagem que nos vem mostraria a marcha de um dínamo acoplado na tomada de gás, de onde sai uma pena de pavão que vem fazer cócegas no ventre de uma bela mulher que lá está para a beleza da coisa”. Erotica é a ilustração da pulsão sexual. Madonna passa diretamente ao público a sua força inconsciente e, desse modo, transmite a ideia de que cada um de nós possui igualmente uma força similar. E essa força é em essência sexual e sabemos que é com ela que barramos a força destrutiva da pulsão de morte.
Contracapa de Erotica (1992).
Não à toa, sua bissexualidade foi estampada muitas vezes, seja em suas declarações: “Tive relações sexuais com tantos homens e mulheres que eu quis”; e também: “Eu me sinto um homem gay preso no corpo de uma mulher”; seja nos beijos em parceiras nos shows e na personagem dominatrix que criou, Dita Parlo. Não à toa o papa João Paulo II declarou no momento em que esta turnê era proibida na Itália: “Com a Blond Ambition Tour, Satã foi novamente solto no mundo”.
Mas não deveria ser tão difícil para o papa entender que se Santa Teresa tivesse vivido no século XX, ela se chamaria Madonna, pois sua obra é uma constante celebração (palavra que ela adora) que oscila do gozo fálico (sexual) ao gozo místico (gozo Outro). E nessa alternância singular – aliás própria ao feminino que, segundo Lacan, frequenta ambas as formas de gozo –, sua figura sofre os efeitos de uma transformação constante.
Apaixonada pelo poder das palavras e pela sedução pura dos semblantes, Madonna é lacaniana.
Ela mesma alude a si mesma como uma fera ao dizer: “The stage is my cage”. No palco sem grades, se movendo continuamente de um lado para o outro, em turnês gigantes, a fera exibe seu poder. Apaixonada pelo poder das palavras e pela sedução pura dos semblantes, Madonna é lacaniana. Ela é uma artista completa, que não se limita ao canto ou à dança para se expressar, mas se vale em seus shows da tecnologia mais avançada para produzir o impacto emocional no espectador.
V
Madonna é essencialmente uma artista performática e é preciso considerar o rumo que sua arte tomou como sendo a expressão bem-sucedida dos avanços e conquistas de diversas artes reunidas em prol de uma arte performática completa. No campo da música, Laurie Anderson, Meredith Monk já haviam empreendido espetáculos com grande intensidade dramática. Sabe-se que o início da carreira de Madonna só pôde começar a deslanchar através de suas performances ao vivo, ao passo que suas gravações iniciais encontravam pouca receptividade. Sem ter ainda nenhuma canção tocando no rádio, Madonna já possuía uma legião de fãs que a seguiam de show em show nos palcos nova-iorquinos.
Originária de uma sequência que envolve a action painting de Pollock, as collages de Max Ernst, as assemblages de Kurt Schwitters, as colagens de impacto de Allan Kaprow, denominadas de environments, a live art do grupo japonês Gutai, e os happenings desenvolvidos pelo próprio Kaprow, a performance é um movimento artístico que surgiu no início dos anos setenta, e como os que o antecederam, “apontava para uma única direção: reexaminar os objetivos da arte.” Seus precursores foram todos os poetas, pintores, músicos, dançarinos, escultores, cineastas, dramaturgos e pensadores que buscavam um reestudo dos objetivos da arte. O termo performance tem duas conotações: a de uma presença física e a de um espetáculo, algo para ser visto (spectaculum).
O happening é o antecessor imediato da performance e, ainda que ele tenha passado a ter implícito em seu conceito o caráter de espontaneidade, o primeiro happening assim batizado por Kaprow ao apresentar sua obra 18 happenings em 6 partes no outono de 1959 na Reuben Gallery em Nova Iorque foi ensaiado durante duas semanas antes da estreia e durante a semana em que permaneceu em cartaz.
As performances visam o despertar o olhar do espectador e sua forma de ver o mundo e até mesmo a obra de arte. A arte da performance é basicamente uma arte de intervenção, modificadora, que visa causar uma transformação no receptor. Através de breves mensagens poéticas diretas e minimalistas, como Express yourself, Nobody’s perfect, Madonna se dirige ao auditor e ao espectador como uma flecha do arqueiro zen, direto no alvo sem escalas. Não é possível deixar de evocar o dizer de Jerzy Grotowski que enuncia como tese de seu Teatro Pobre algo que poderia ser usado para definir a atitude disruptiva de Madonna em cena: “Devemos visar a descoberta da verdade em nós mesmos, arrancar as máscaras atrás das quais nos escondemos diariamente. Devemos violar os estereótipos de nossa visão do mundo, os sentimentos convencionais, os esquemas de julgamento”.
VI
Madonna já foi considerada como tendo tido um impacto tão grande na cultura popular quanto Foucault teve na cultura acadêmica, o de uma descentralização das tendências do mainstream para o marginal. Vejo em Madonna uma psicanalista da cultura. Se levarmos a sério a formulação de Freud de que o poeta e o artista sempre precedem o psicanalista, então o artista representa na cultura da qual ele faz parte uma posição de analista, pois ele ouve antecipadamente o sintoma em jogo nela e o condensa em sua obra. O artista analisa a cultura no sentido de que, tal como uma antena parabólica, ele elabora suas questões pessoais através da linguagem e dos sintomas de sua época. Uma cultura, em sua arrogância, pode ser definida como um conjunto de fantasias entronizadas como tais, isto é, uma cultura dá sentido a algumas manifestações, privilegiando-as em detrimento de outras. E o artista articula sua fantasia com as fantasias da cultura, através do que frequentemente ele pode colocar a cultura no divã. Numa posição de condensadora sintomática da cultura, Madonna canta em sua música Die another day: “Dr. Sigmund Freud, analyse this, analyse this, analyse this!”.
Perguntada sobre qual música define melhor sua criação musical, Madonna respondeu que é a canção Express yourself, do início de sua carreira. De fato, essa ideia retorna no ritornello da letra de Human nature, onde se ouve “Express yourself, don’t repress yourself”. As letras de suas músicas, cantam o despertar através da liberdade sexual e da ultrapassagem dos preconceitos. Elas abordam frequentemente a necessidade do posicionamento desejante de cada um, especialmente da mulher, e invectiva com veemência a adoção de uma firmeza que contrarie os cânones da cultura e do establishment. Ela fala igualmente de uma pressa que é preciso ter, o tempo surge com frequência em suas letras: you don’t have the luxury of time.
Seus versos surpreendem por sua vocação para despertar o sujeito, incitando-o continuamente a voltar-se para si mesmo e seus desejos, sem medo. Ela disse certa vez: “Em todo o meu trabalho, o objetivo é nunca ter vergonha: de quem você é, do próprio corpo, do próprio físico, dos seus desejos, das suas fantasias sexuais. A razão pela qual intolerância, sexismo, racismo, homofobia existem é o medo. As pessoas têm medo de seus próprios sentimentos, medo do desconhecido. E o que eu estou dizendo é: não tenha medo”. É impressionante saber que, ao ser perguntado numa entrevista na Itália sobre o por que as pessoas procuravam análise, Lacan respondeu: “Medo”.
A perspectiva musical de Madonna se evidencia na música Music, na qual canta que a música aproxima as pessoas. Mas sua contribuição maior é aquela que reflete a tendência à fusão de diversos ritmos e harmonias, do rock and roll ao soul, da party music ao rap, ao funk e à balada romântica. Uma música sem fronteiras que acaba unindo ocidente e oriente numa mesma criação.
Susan Sontag chamou de “heróis da vontade radical” àqueles artistas – entre os quais incluiria Madonna – que não se submetem ao cinismo do sistema e praticam uma arte da transcendência, às vezes à custa de suas vidas pessoais. O desejo decidido de Madonna e dos grandes artistas em geral nos remete a uma colocação feita por Freud para falar da maneira pela qual ele concebe a relação do psicanalista com a psicanálise. É significativo, aliás, para nossa argumentação que Freud compare nesse caso o psicanalista com ninguém mais do que o artista: a relação do psicanalista com a análise deve ser tão radical como aquela do artista “que compra tintas com o dinheiro do sustento da casa e queima os móveis para aquecer sua modelo”.
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